Por: João Jeronimo Monticelli
As sondagens mecânicas permitem amostrar, identificar e caracterizar os diversos horizontes de solos e rochas, incluindo a presença de água ou de fluidos contaminantes. A amostragem, identificação e caracterização dos materiais visam obter informações para a aplicação em estudo, projeto e construção de obras de engenharia civil e mineira e, ainda, para controle e recuperação de áreas contaminadas. O conceito também pode ser ampliado e incluir investigações dos materiais ditos antropogênicos, ou não naturais, como aterros de barragens e pilhas de rejeito.
- Fique atento: A execução de sondagens mecânicas em materiais antropogênicos, como aterros de barragens e pilhas de rejeito, requer cuidados muito especiais, para que não ocorra impacto indesejável e que comprometa a performance e resistência mecânica do material investigado.
Dentre os vários métodos de sondagens mecânicas, os mais utilizados são: sondagens a trado, percussão, rotativa e mista. Esses métodos possuem, cada um, finalidade específica, que deve ser considerada pelos protagonistas envolvidos, como o Investidor, a Fiscalização, o Executor e, principalmente pelo usuário das informações, no caso a Projetista ou o próprio Investidor.
Imagem 01 - Equipe Suporte Solos durante execução de ensaio de campo
O livro “Manual de Sondagens”, editado pela ABGE-Associação Brasileira de Geologia de Engenharia e Ambiental, em 2021 (Monticelli, 2021) inicia o tratamento do assunto justamente com comentários sobre os diversos participantes que interferem na execução de sondagens mecânicas e as responsabilidades de cada um (inclusive legais). Dentro desse contexto, os Termos de Referência, que definem os trabalhos e fazem parte do Contrato com o Executor, devem ser completos e especificar, no mínimo: localização da sondagem (coordenadas e cotas), profundidade a atingir, critério de paralização do furo, técnicas de perfuração e de amostragem a obedecer, metodologia de descrição e acondicionamento das amostras e, muito importante, padronização técnica e digital, desde a coleta dos dados até a apresentação dos resultados.
As sondagens em solo avançam nos terrenos através de diversos tipos de trado. Quando requerem a realização de ensaios de penetração padronizado (SPT – Standard Penetration Test) passam a ser denominadas “sondagens a percussão”. As sondagens a percussão são as investigações mais comuns para definição de fundações isoladas em solo, pois o índice de penetração SPT , juntamente com o uso de bibliografia e a experiência do projetista, permite correlação direta com a capacidade de suporte dos terrenos e escolha do tipo de fundação (sapata, radier, estaca, tubulão etc.).
As sondagens em rocha exigem equipamentos e técnicas de perfuração que permitam amostragem mínima de 90% por manobra, salvo aprovação em contrário da Fiscalização e de acordo com o Contrato. Em pesquisa mineral a exigência pode ser de 100%, decorrente da importância em se amostrar e quantificar a mineralização de interesse. As condições dos maciços naturais, de solo e de rocha, no Brasil, são muito diferentes das dos países de clima temperado e frio.
Imagem 02 - Coleta de amostras de solo em campo
Aqui no Brasil é muito comum cobertura vegetal intensa, solos bastantes espessos e a presença de rochas muito alteradas, de difícil amostragem. As sondagens (em solos e em rochas) exigem conhecimento prévio do perfil de intemperismo do local, sob risco de má interpretação dos resultados. Sondagens em rocha alterada (branda) e mesmo sã (bastante coerente) exigem equipamentos e técnicas acuradas, para garantia da recuperação mínima de testemunhos de 90%, ou seja, para em cada um metro de perfuração se recuperar, no mínimo, 90 cm de testemunhos. E os testemunhos de rocha devem estar íntegros, encaixados uns nos outros, sem presença do que se chama “testemunhos roletados”.
Somente com boa amostragem da rocha é possível identificar e descrever com acuidade as características das descontinuidades (fraturas , principalmente) que, junto como o tipo litológico (granito, xisto, arenito etc.) e demais parâmetros geotécnicos (alteração, coerência etc.) irão condicionar a escavabilidade e a resistência mecânica do maciço. Isso requer equipamentos, pessoal qualificado e técnicas adequadas de perfuração e tudo isso tem o seu custo. Porém, lembrem-se: a redução de investimentos em investigações não é uma boa decisão a tomar e pode ter um alto preço a pagar no desenvolvimento de um projeto, inclusive em sua performance econômica.
Imagem 03 - Testemunho de rochas
As sondagens mecânicas, em solos e rochas, fazem parte do universo maior das “Investigações geológico-geotécnicas” (Monticelli, 2021). Isso tem enorme significado ao entendimento da finalidade da própria sondagem mecânica e de seus resultados, já que se trata de uma informação obtida em um ponto. Caso o projeto e obra seja uma fundação isolada, por exemplo, o resultado obtido é bastante consistente (sempre considerando que todos os trabalhos foram bem-feitos). A correlação ou extrapolação desse resultado pontual a outros locais deve ser feita com cuidado. E, quanto maior a complexidade geológica local, maior a necessidade de informações complementares às sondagens mecânicas, como levantamentos geológico-geotécnicos de campo (mapas, cartas, imagens de satélite) e geofísicas, que permitam correlação entre os pontos das sondagens. O livro “Investigações Geológico-Geotécnicas para Obras de Infraestrutura” , de autoria de Giuliano de Mio, João Jeronimo Monticelli e Maurício Malanconi, que faz parte da publicação da ABGE anteriormente citada (Monticelli, 2021), contém informações que ajudam a entender o universo das “investigações” e os níveis de detalhamento necessários nas várias etapas do ciclo de vida de uma obra, desde as fases de projeto (inventário, viabilidade, projeto básico, projeto executivo), até a de operação e de descaracterização ou descomissionamento. Essa publicação resgata metodologias, conceitos e definições das décadas de 1960 e 1970, época áurea das grandes obras de engenharia no país, e incentiva o uso de metodologias digitais e padronizadas, desde a coleta até a apresentação dos resultados de sondagens, com ganhos econômicos e de qualidade para toda a rede de empresas envolvidas. Faz parte desta publicação uma Tabela síntese dos tipos de investigações geológico-geotécnicas mais utilizadas no Brasil, com indicação das finalidades principais de cada uma, fundamental para o leitor entender o tema e situar o seu trabalho no universo amplo das investigações.
João Jeronimo Monticelli, Geólogo (IGc-USP, 1971) e
Mestre em Geotecnia (EESC-USP, 1984) é especialista em
Geologia de Engenharia e em Gestão de Recursos Hídricos.