Por: João Jeronimo Monticelli
Solo em engenharia civil
A palavra “solo” tem significados distintos sob o ponto de vista da geologia de engenharia, da engenharia civil e da pedologia, conforme abordagens de Vaz e Gurgueira (2018), Fortes e Ferreira (2018) e Antunes e Salomão (2018), respectivamente. Solo, em engenharia civil, é o material natural que pode ser escavado por meio de ferramenta e que se desagrega em presença de água (Massad, 2016).
O solo constitui importante material de construção e suas propriedades precisam ser estudadas previamente, para bons projetos de barramentos, aterros e bases de pavimentos (Figura 1). Os estudos também são necessários para taludes, pois é preciso conhecer as propriedades mecânicas e hidrológicas do solo natural para dimensionamento dos processos de escavação e definições da inclinação e drenagem dos taludes (Figura 2). Tudo isso tem relação direta com os custos de uma obra. Um dimensionamento muito conservador leva a aumento de custos. Um dimensionamento arrojado, sem base em conceitos e parâmetros geotécnicos confiáveis, leva a riscos de colapso ou de reparos frequentes. Os dados dos ensaios e a experiência profissional para análise dos resultados são de fundamental importância. E tudo começa por uma boa amostragem, que envolve a coleta, armazenamento e transporte das amostras até o laboratório.
Figura 1 – Foto de aterro – Loteamento Area – São Pedro. Fonte: Arquivo Suporte
Figura 2 – Foto de talude em solo. Fonte: Arquivo Suporte
Representatividade dos ensaios
Os ensaios de laboratório (completados com investigações geológico-geotécnicas, ensaios de campo e experiência profissional) visam identificar as propriedades e estabelecer parâmetros numéricos aos solos, para dimensionamentos de obras geotécnicas e cálculos de estabilidades. Em regiões tropicais, como o Brasil, é comum dificuldades em separar a camada de solo homogêneo (isotrópico) da camada de solo heterogêneo (anisotrópico) e bem identificar o topo de rocha. (Figuras 3 e 4). No solo homogêneo os valores numéricos obtidos nos ensaios tendem a se manter mais uniformes, mais fáceis de serem interpretados e correlacionados com os extratos, tanto lateralmente como em profundidade. Já no solo heterogêneo isso não acontece, as propriedades variam mais, exigindo número maior de amostragem e um bom estudo que permita utilizar corretamente os dados obtidos nos ensaios.
Figura 3 – Perfil de solo homogêneo. Fonte: Imagem da Internet/Minas Júnior
Figura 4 – Perfil de solo heterogêneo. Fonte: Arquivo Suporte
As obras lineares, como estradas, ferrovias e linhas de transmissão, atravessam vários tipos e extratos de solo (e de rochas), o que aumenta a complexidade e exige maior experiência dos profissionais envolvidos, para interpretar os dados de ensaios. Levantamentos de campo e consulta a mapeamentos geológicos e pedológicos são recomendados, para ajudar na correlação entre os resultados de ensaios e os tipos de solos (e de rochas) encontrados ao longo do traçado.
Responsabilidades
Um laboratório de ensaio possui responsabilidade sobre os resultados de cada amostra ensaiada, mas não sobre a sua representatividade e posterior uso no projeto. O mercado tem plena consciência dessa situação e das responsabilidades das partes. E sabe, muito bem, que o resultado de ensaio de laboratório é um dado primário e básico, utilizado para todas as demais fases do projeto e da obra geotécnica.
O ideal é haver interação entre o usuário dos dados (projetista) e os profissionais que realizaram os ensaios, e isso desde a especificação dos critérios de coleta e das normas a utilizar, até o fornecimento dos resultados. Segundo Carlos Christian da Silva -- Tecnólogo Civil e Geotécnico pela FATEC e UNICID (São Paulo) e especialista de ensaios de campo e laboratório da SUPORTE -- o laboratório deve atender rigorosamente as normas especificadas em contrato ou combinar previamente com o cliente (caso não suficientemente descritas no contrato) quais serão as normas de ensaios a serem utilizadas. “Por vezes, nos reunimos com clientes para analisar a metodologia utilizada e os resultados obtidos nos ensaios, e isso é mais comum quando a projetista responsável já está presente”, informa Carlos.
Ensaios mais comuns e normas de execução
A publicação “Investigações geológico-geotécnicas para obras de infraestrutura” (De Mio et al., 2021), contém uma tabela com a descrição dos ensaios mais frequentes realizados em amostras deformadas e indeformadas de solos, muito útil para uma visão geral do assunto. Fotos ilustrativas e descrições simplificadas de diversos tipos de ensaios em solos (caracterização, compactação, adensamento, compressão triaxial etc.) podem ser acessadas em sites de busca na internet e em nosso site www.suportesolos.com.br.
Os ensaios laboratoriais em solo são realizados com base em procedimentos consagrados no meio técnico, como as normas ASTM, ABNT-NBR, DNER, DNIT e dos DERs estaduais. Artigos e livros técnicos complementam as normas. Na bancada do laboratório da Suporte Solos, por exemplo, estão presentes as publicações “Curso básico de mecânica de solos” (Pinto, 2012), “Pavimentos econômicos: tecnologia do uso dos solos finos lateríticos” (Villibor e Nogami, 2009) e o livro “Manual of soil laboratory testing” (Head, 1984), dentre outros.
A amostra de solo encaminhada ao laboratório tem a sua identificação geralmente acompanhada de foto, descrição tátil visual da granulometria e cor, por vezes a descrição de origem geológica e pedológica do solo. É muito importante, em determinados ensaios, a descrição prévia da presença de características anisotrópicas, que podem condicionar propriedades mecânicas e hidráulicas de uma amostra durante o ensaio. Um minúsculo veio de quarto, presente numa amostra indeformada, submetida a ruptura no ensaio de compressão triaxial, por exemplo, pode ser condicionante da ruptura.
A identificação de anisotropia (descontinuidade) no solo, principalmente em amostras indeformadas, pode assumir importância maior ou menor, a depender do ensaio e da obra geotécnica. Além dos solos naturais anisotrópicos, outro grande desafio à investigação, a ensaios e ao estabelecimento de parâmetros numéricos, é o universo dos materiais ditos antropogênicos (construídos pelo homem), como são os casos de barragens de terra, aterros sanitários e estruturas de contenção de rejeitos de mineração (De Mio, 2021).
As Figuras 5 e 6 ilustram ensaios de laboratório em amostras deformadas e indeformadas de solo.
João Jeronimo Monticelli, Geólogo (IGc-USP, 1971) e
Mestre em Geotecnia (EESC-USP, 1984) é especialista em
Geologia de Engenharia e em Gestão de Recursos Hídricos.
Antunes, F.S.; Salomão, F.X.T. 2018. Solos em pedologia. Cap.5. In.: Oliveira, A.M.S.; Monticelli, J.J. Geologia de Engenharia e Ambiental. Editores. Coletânea: 916 Pg, 40 Cap., Vol. 1,2,3. São Paulo: ABGE.
De Mio, G.; Monticelli, J.J.; Malanconi, M. 2021. Investigações geológico-geotécnicas para obras de infraestrutura – Diretriz AGS BR. Livro 1. In.: Monticelli, JJ. Editor. Investigações geológico-geotécnicas – Guia de boas práticas. São Paulo: ABGE.
Fortes, R.M; Ferreira, R.C. 2018. Solos em engenharia. Cap. 4. In.: Oliveira, A.M.S.; Monticelli, J.J. Geologia de Engenharia e Ambiental. Editores. Coletânea: 916 Pg, 40 Cap., Vol. 1,2,3. São Paulo: ABGE.
Head, K.H. 1984. Manual of soil laboratory testing. Vol 1,2,3. UK: Pentech Press.
Massad, F. 2016. Mecânica de solos experimental. São Paulo: Oficina de Textos.
Pinto, C.S. 2012. Curso básico de mecânica de solos. 3ª Edição. São Paulo: Oficina de Textos.
Vaz, L.F; Gurgueira, M.D. 2018. Solos em geologia de engenharia. Cap. 3. In.: Oliveira, A.M.S.; Monticelli, J.J. Geologia de Engenharia e Ambiental. Editores. Coletânea: 916 Pg, 40 Cap., Vol. 1,2,3. São Paulo: ABGE.
Villibor, D. F.; Nogami, J. S. 2009. Pavimentos econômicos: tecnologia do uso dos solos finos laterítico. São Paulo: Arte & Ciência.